Pergunte a qualquer criança que está começando a ter contato com o futebol: em qual posição você quer jogar? Nove em dez dirão: atacante.
A razão é óbvia: o atacante joga mais perto do gol adversário. Assim, ao receber a bola, sua chance de mandar a bola para as redes aumenta.
E qual o maior objetivo do futebol, a maior alegria no futebol? O gol. Tá explicado, é desnecessário elencar outros motivos ou justificativas.
A criança atacante cresce e, se não mudar de posição, torna-se um(a) jovem atacante. Que cresce (não só no tamanho, mas na carreira) e, mantendo-se na posição, torna-se um adulto atacante.
Sendo bom o suficiente, passa a vestir a camisa de um clube profissional, com remuneração financeira, disputa de títulos, viagens, e por aí vai. Jogando bola, e de atacante: sonho realizado, eis um raro sortudo entre tantos que quiseram, tentaram e fracassaram.
Só que nem sempre é simples assim. O papel de atacante é como o do protagonista de um filme: a responsabilidade é muito maior. Com a diferença de que o ator não precisa fazer gols, e o atacante, sim.
É exatamente aí que reside o problema: na falta de gols. Disse alguém um dia –não consegui descobrir quem– que “o atacante vive de gols”. Virou clichê: dez entre dez deles já disseram pelo menos uma vez na vida essa frase, seja nos microfones ou fora deles.
O que quer dizer “o atacante viver de gols”? É uma conotação que tem interpretação muito simples: o gol para ele é o seu alimento, o seu combustível, o seu oxigênio, a sua sobrevivência. A falta de gol resultará em desnutrição, em pane seca, em falta de ar e, em instância final, na morte.
Essa morte é simbólica. Significa que a aversão, que se sucede ao descontentamento, de torcedores e dirigentes se torna tão grande ao atacante que não cumpre a sua principal função que ele “morre” para o clube. É negociado com valor depreciado ou simplesmente dispensado.
Disso se conclui a importância de o atacante estar sempre fazendo gols. Para manter sua confiança elevada e para corresponder aos anseios do empregador e do cliente (torcida).
A expectativa em torno do desempenho de um atacante é ampliada quando ele muda de equipe. Se custou caro, vai às alturas, cresce de forma exponencial.
É o caso de Matheus Cunha, 26. Campeão olímpico nos Jogos de Tóquio, em 2021, o paraibano de João Pessoa, prata da casa do Coritiba, depois de passagens discretas por Sion (SUI), Leipzig e Hertha Berlin (ALE) e Atlético de Madrid (ESP), subiu de produção no inglês Wolverhampton.
Seus 15 gols na Premier League de 2024/2025 pelo clube mediano fizeram o abastado e claudicante Manchester United desembolsar 74 milhões de euros (R$ 464 milhões no câmbio atual) pelos préstimos do brasileiro.
Esperava-se que ele “entregasse” rapidamente o que um atacante “entrega”: gols. Que não vieram. Passaram-se dois meses, oito jogos, mais de 500 minutos em campo –uma eternidade–, e nada.
Até que contra o Brighton, no sábado (25), ouviu de companheiros: “Olha só, você sabe fazer gol”.
Era uma ironia, resultante da seca pela qual passava o brasileiro, que acabara de marcar um gol no jogo em Manchester. O tom era cordial, mas embutia a desconfiança que passou a existir na capacidade de Matheus Cunha cumprir sua função primordial.
O camisa 10 não escondeu o alívio: “Finalmente! Eu estava ansioso. Quando você joga na frente, precisa fazer gols. O momento chegou”.
Foi um desafogo, um respiro, um refresco. Ele sabe, contudo, que precisa manter esse momento e acelerar a artilharia para evitar o avizinhamento da “morte”.
Que no Man United veio implacável, sem dó, em temporadas recentes, para artilheiros como o inglês Rashford, o dinamarquês Hojlund e o holandês Weghorst. Nem Cristiano Ronaldo, na passagem mais recente, sobreviveu.
LINK PRESENTE: Gostou deste texto? Assinante pode liberar sete acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.

Deixe um comentário