
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou nesta sexta-feira (24) que o governo pagará todos os precatórios expedidos pelo Judiciário, apesar de não concordar com a decisão. Haddad disse considerar “ilegal, inconstitucional e irracional” o adiamento desses pagamentos pelo governo Bolsonaro (PL). Os precatórios são dívidas dos governos com pessoas e empresas já reconhecidas pela Justiça em todas as instâncias.
“Repudiamos o calote que foi dado pelo governo anterior e não queremos esse caminho que, na nossa opinião, só desmerece o país e coloca em risco a condição do país”, disse o ministro durante o Seminário de Precatórios promovido pelo Instituto dos Advogados de São Paulo (Iasp).
Por este motivo, segundo ele, a União decidiu ficar de fora da tramitação da PEC do “calote dos precatórios” (PEC 66/23), que gerou a Emenda Constitucional (EC) 136. A proposta autoriza o parcelamento e a rolagem indefinida de precatórios estaduais e municipais, retira os federais da regra fiscal a partir de 2026 e ainda reduz o índice de reajuste dos valores devidos.
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“As pessoas não tiram da minha conta o que eu paguei da gestão anterior, colocam na minha conta. Mas eu paguei uma dívida do governo anterior que tinha que ser paga. Eu prefiro ficar com a pecha de quem está gastando demais do que com a pecha de caloteiro, é assim que eu funciono”, disse Haddad.
O ministro defendeu que o equilíbrio fiscal deve ocorrer de forma sustentável e respeitando as decisões judiciais. “Resolver o problema fiscal desse jeito qualquer um resolve. Tem que resolver o problema fiscal de maneira sustentável, e é o que nós estamos procurando fazer”, ponderou.
Governo Bolsonaro adiou precatórios
Em 2021, o Congresso aprovou a chamada PEC dos Precatórios, apresentada pelo então presidente Jair Bolsonaro (PL). A Emenda Constitucional (EC) 114/2021 permitiu ao governo pagar apenas parte dos precatórios com vencimento nos cinco anos seguintes, de 2022 a 2026, além de mudar a metodologia para cálculo da correção do teto de gastos.
A União deixou de pagar R$ 43,8 bilhões dos R$ 89,1 bilhões originalmente comprometidos para precatórios em 2022, além de ganhar um espaço adicional de mais R$ 62,2 bilhões com a atualização da regra do teto. Com isso, Bolsonaro aumentou o valor médio da parcela do Auxílio Brasil (atual Bolsa Família) em seu último ano de mandato, quando disputaria a reeleição.
À época da tramitação da PEC, o então ministro da Economia, Paulo Guedes, chegou a dizer que, sem o adiamento no pagamento de precatórios, o governo não poderia cumprir com todas suas despesas obrigatórias, incluindo o pagamento de salários de servidores.
PEC do “calote dos precatórios”
Em novembro de 2023, o Supremo Tribunal Federal (STF) liberou o pagamento de precatórios pelo governo Lula (PT) sem infringir as regras fiscais até 2026. A Corte determinou que os pagamentos voltariam ao limite oficial de despesas a partir de 2027.
Em dezembro de 2023, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) editou uma Medida Provisória (MP) que abria R$ 93 bilhões em crédito extraordinário para os precatórios. Esses créditos extraordinários foram cobertos por emissão de dívida pública, contraída pelo Tesouro para financiar o déficit orçamentário do governo federal.
O governo quitou os precatórios de 2022 que estavam atrasados, pagou os de 2023 e adiantou parte dos de 2024, todos fora do limite de despesas do antigo teto de gastos e do novo arcabouço fiscal. Para 2025 e 2026, a regra seria a mesma: precatórios fora da meta. Após a decisão do STF, o Ministério do Planejamento apontou que o Orçamento ficaria sem espaço para despesas obrigatórias a partir de 2027.
A PEC 66/2023 incluiu na Constituição que os pagamentos de precatórios serão feitos fora do limite de gastos do arcabouço fiscal, além de serem paulatinamente (e não de uma vez) reincluidos no cálculo da meta de resultado primário. No mês passado, o Congresso promulgou essa proposta.
A EC 136 autorizou o parcelamento e a rolagem indefinida de precatórios estaduais e municipais e retirou os federais da regra fiscal a partir de 2026, abrindo espaço no Orçamento e reduzindo a chance de colapso nas contas públicas.
O novo índice de correção dos precatórios prejudica credores. Até agora, a taxa aplicada era a Selic, que está em 15% ao ano. Com a promulgação da EC 136, passa a ser o IPCA mais 2%, ou seja, o índice da inflação acrescido de 2% ao ano – o equivalente, hoje, a pouco menos de 7,5%.
OAB acionou STF contra mudanças nos precatórios
Em setembro, a Ordem dos Advogados do Brasil acionou o Supremo Tribunal Federal (STF) para tentar barrar a PEC do “calote dos precatórios”, que deu origem à Emenda Constitucional (EC) 136, promulgada em setembro pelo Congresso.
Durante o evento com Haddad, o vice-presidente do Conselho Federal da OAB, Felipe Sarmento, disse que a ação “questiona dispositivos que permitem o adiamento indefinido, a perda do valor real do crédito e a ausência de previsibilidade”, informou a Agência Brasil.
“O pagamento de precatórios não é uma planilha contábil. É respeito à autoridade do Judiciário e à dignidade do cidadão que esperou, confiou e venceu. A emenda constitucional, promulgada em setembro, alterou profundamente esse cenário”, destacou Sarmento. Segundo ele, as mudanças previstas na EC 136 “transformaram as exceções em regra e abriram um caminho para uma moratória permanente”.

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