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Fim de jornada de trabalho 6×1 pode gerar desemprego



Trabalhar menos e ganhar o mesmo. A promessa parece irresistível para os quase 49 milhões de trabalhadores brasileiros com carteira assinada. Mas muitos economistas alertam: as propostas de emenda à Constituição (PEC) que reduzem a jornada para 36 horas semanais pode custar R$ 300 bilhões por ano e eliminar 2,7 milhões de empregos formais.

Audiência pública realizada nesta terça-feira (21), na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, expôs um racha entre governo e oposição. A pauta da reunião foi a proposta mais antiga de redução da jornada, apresentada pelo senador Paulo Paim (PT-RS) em 2015.

Enquanto o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e os ministros Luiz Marinho (Trabalho) e Gleisi Hoffmann (Relações Institucionais) apoiam a medida como avanço social, o senador Rogério Marinho (PL-RN) alertou contra a “tentação de mudar a economia por caneta”.

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Além do projeto do senador gaúcho, que prevê transição gradual de quatro anos, outras três PECs sobre o tema tramitam no Congresso.

Audiência na CCJ expõe divisão sobre a proposta

A audiência revelou o abismo entre defensores e críticos da redução da jornada de trabalho. O projeto de Paim propõe transição gradual de quatro anos, reduzindo a jornada de 44 para 40 horas no primeiro ano, e chegando a 36 horas semanais ao fim do período.

Durante a audiência, o senador Rogério Marinho (PL-RN) foi enfático ao criticar a proposta. “Não podemos mudar a economia por caneta. É preciso análise rigorosa dos impactos antes de aprovar mudanças dessa magnitude”, afirmou. Marinho argumentou que a medida pode comprometer a competitividade do país e agravar o desemprego, especialmente entre jovens e trabalhadores menos qualificados.

Representantes de centrais sindicais e movimentos sociais defenderam que a redução da jornada é uma questão de saúde pública e justiça social, citando estudos que relacionam jornadas extensas a doenças ocupacionais e acidentes de trabalho.

A PEC ainda precisa ser aprovada pela CCJ antes de seguir para votação no plenário do Senado. Caso aprovada, precisará de três quintos dos votos (49 senadores) em duas votações na Casa, e depois passar pelo mesmo processo na Câmara dos Deputados.

Quatro propostas em tramitação no Congresso

Além do projeto de Paulo Paim no Senado, outras três PECs tramitam na Câmara dos Deputados, cada uma com abordagem diferente para a redução da jornada:

  • PEC 116/2023 (Senado) – Paulo Paim (PT-RS): Propõe redução gradual de 44 para 36 horas semanais em quatro anos, com transição escalonada para permitir adaptação do setor produtivo.
  • PEC 6×1 – Erika Hilton (PSOL-SP): A proposta mais radical, defende redução imediata para 36 horas semanais distribuídas em quatro dias de trabalho, eliminando o modelo 6×1 (seis dias de trabalho por um de descanso).
  • PEC Reginaldo Lopes (PT-MG): Sugere redução para 40 horas semanais, com possibilidade de negociação coletiva para ajustes setoriais.
  • PEC Cleitinho (Republicanos-MG): Propõe modelo flexível que permite acordos entre empresas e trabalhadores, respeitando o limite máximo de 40 horas semanais.

A multiplicidade de propostas reflete a complexidade do debate e a dificuldade de construir consenso sobre o tema.

Governo Lula abraça a bandeira da redução da jornada

O governo federal transformou a redução da jornada de trabalho em bandeira política. O presidente Lula declarou publicamente que pretende “aprofundar o debate” sobre o tema e sinalizou que a medida pode se tornar pauta prioritária para as eleições de 2026.

O ministro do Trabalho, Luiz Marinho, tem defendido a proposta em eventos públicos, argumentando que a redução da jornada é “evolução natural” das conquistas trabalhistas e que o Brasil precisa acompanhar tendências internacionais de valorização da qualidade de vida.

Gleisi Hoffmann, ministra das Relações Institucionais, foi além e afirmou que o governo está disposto a negociar com o Congresso para viabilizar a aprovação da medida, sinalizando que o Planalto pode oferecer compensações fiscais ou incentivos para empresas que adotarem a jornada reduzida.

Na avaliação do governo, a redução da jornada pode servir como bandeira para reconquistar apoio popular, especialmente entre trabalhadores urbanos das classes C e D, base eleitoral tradicional do PT.

“Efeito bumerangue”: setor produtivo alerta para riscos

A resistência do setor empresarial é categórica. José Pastore, professor titular da Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo (FEA-USP), resume a preocupação: “A medida pode ter efeito bumerangue: o objetivo é melhorar a qualidade de vida, mas o resultado pode ser mais desemprego e informalidade”.

Ele argumenta que, sem aumento de produtividade, a redução da jornada obrigará empresas a contratar mais trabalhadores para manter o nível de produção, elevando custos trabalhistas em momento de margens de lucro já comprimidas. A alternativa seria demitir, reduzir investimentos ou migrar para a informalidade.

A Confederação Nacional da Indústria (CNI) apresentou estudo apontando que a redução da jornada poderia custar até R$ 300 bilhões anuais ao setor produtivo e resultar na perda de 2,7 milhões de empregos formais.

João Gabriel Pio, economista-chefe da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg), destaca que pequenas e médias empresas seriam as mais afetadas. “Grandes corporações têm margem para absorver o aumento de custos, mas as menores operam com margens apertadas. Muitas não sobreviveriam”, afirma.

O problema da baixa produtividade brasileira

Um dos pontos centrais da resistência empresarial é a baixa produtividade da economia brasileira. Fernando de Holanda Barbosa Filho, pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre), aponta que a produtividade do trabalhador brasileiro corresponde a menos de um quarto da americana.

“Reduzir a jornada sem aumentar a produtividade pode comprometer ainda mais a competitividade do país”, alerta Barbosa Filho. A tendência seria de aumento do “Custo Brasil” – que inclui infraestrutura deficiente, burocracia excessiva, carga tributária elevada e baixa qualificação da mão de obra.

Para o setor empresarial, antes de reduzir horas trabalhadas, o país deveria investir em modernização tecnológica, capacitação profissional, desburocratização e reformas estruturais que aumentem a eficiência produtiva.

A comparação internacional reforça o argumento: países que reduziram a jornada com sucesso, como Alemanha e países nórdicos, têm níveis de produtividade muito superiores aos brasileiros, o que permite manter competitividade mesmo com menos horas trabalhadas.

Sindicatos e movimentos sociais defendem qualidade de vida

Do outro lado do debate, defensores da redução argumentam que jornadas extensas prejudicam a saúde física e mental dos trabalhadores, reduzindo a produtividade no longo prazo.

Clemente Ganz Lúcio, integrante do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, defende que trabalhadores descansados são mais produtivos. “A redução da jornada não é apenas uma questão trabalhista, é uma questão de saúde pública e eficiência econômica”, afirma.

Cirlene Luiza Zimmermann, coordenadora nacional no Ministério Público do Trabalho, reforça que estudos internacionais mostram correlação entre jornadas longas e aumento de doenças cardiovasculares, transtornos mentais, síndrome de burnout e acidentes de trabalho.

O movimento “Vida Além do Trabalho”, que ganhou força nas redes sociais e já coletou mais de 1,3 milhão de assinaturas em abaixo-assinado digital, mobiliza principalmente jovens trabalhadores em defesa da redução da jornada. O movimento argumenta que o modelo 6×1 (seis dias de trabalho por um de descanso) é incompatível com a vida moderna e impede que trabalhadores tenham tempo para família, estudos, lazer e cuidados com a saúde.

Alternativas em debate

Diante da polarização, economistas e especialistas sugerem caminhos intermediários que poderiam conciliar qualidade de vida com sustentabilidade econômica:

  • Flexibilização negociada: O economista José Pastore defende modelo inspirado na experiência alemã, que permitiria acordos entre empresas e trabalhadores, respeitando particularidades setoriais. “O que funciona para o setor de tecnologia pode não funcionar para a indústria ou o comércio”, argumenta.
  • Incentivos fiscais: A CNI sugere que o governo poderia oferecer benefícios tributários para empresas que adotarem voluntariamente a redução de jornada, compensando parte do aumento de custos trabalhistas.
  • Programas-piloto: Fernando de Holanda Barbosa Filho, da FGV, propõe testar a medida em setores específicos antes da implementação nacional, permitindo avaliação de impactos reais e ajustes necessários.
  • Investimento em produtividade: Entidades empresariais defendem que o país deveria priorizar reformas estruturais que aumentem a eficiência antes de reduzir horas trabalhadas, incluindo modernização tecnológica, capacitação profissional e desburocratização.
  • Trabalho flexível: Especialistas sugerem expandir modelos como home office, jornadas flexíveis e banco de horas, que podem melhorar qualidade de vida sem necessariamente aumentar custos para as empresas.

O que vem pela frente

As PECs ainda estão em fase inicial de tramitação e devem enfrentar longo e turbulento debate no Congresso. A aprovação de qualquer mudança constitucional exige maioria qualificada de três quintos dos votos em duas votações em cada casa legislativa – 49 senadores no Senado e 308 deputados na Câmara.

O calendário político adiciona complexidade ao debate. Com eleições presidenciais em 2026, a proposta pode se tornar moeda de troca em negociações políticas, com parlamentares pressionados entre o apelo popular da medida e a resistência do setor produtivo.

Enquanto isso, o debate expõe tensões estruturais da economia brasileira: baixa produtividade, informalidade elevada que atinge 39% da força de trabalho, desigualdade social e dificuldade histórica de conciliar avanços sociais com sustentabilidade econômica.



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